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A Proteção Integral da Pessoa Idosa: um Diálogo entre o Direito de Família e o Direito do Consumidor

  • Foto do escritor: Marco Alves
    Marco Alves
  • 4 de jul.
  • 3 min de leitura

04/07/2025


A decisão recente do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), na Apelação Cível nº 1500331-94.2024.8.26.0541, trouxe à tona uma importante reflexão sobre a interseção entre o Direito de Família e o Direito do Consumidor: a necessidade de reforço institucional e jurídico à proteção das pessoas idosas, especialmente diante de práticas comerciais abusivas que se aproveitam de sua vulnerabilidade.


O caso: contratos de seguro “gratuito” e descontos indevidos

Na origem do processo, o Ministério Público de São Paulo ajuizou ação civil pública contra um grupo de empresas do setor securitário e financeiro, alegando que essas instituições vinham praticando condutas abusivas na comercialização de seguros de vida a idosos. A prática se dava por meio de contatos telefônicos que ofereciam supostos “benefícios gratuitos”, que, efetivamente, resultavam em descontos indevidos sobre os proventos da aposentadoria dos consumidores.


O juízo de primeiro grau reconheceu a ilicitude da conduta e fixou indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 1.500.000,00, decisão que foi mantida pelo TJSP, que ressaltou a gravidade dos danos causados ao grupo hipervulnerável dos idosos.


Vulnerabilidade como ponto de convergência entre os ramos do direito

Tanto o Direito do Consumidor quanto o Direito de Família reconhecem a vulnerabilidade da pessoa idosa como vetor de proteção jurídica.


Pelo viés consumerista, o artigo 4º, I, do Código de Defesa do Consumidor (CDC) estabelece a proteção do consumidor como parte hipossuficiente nas relações de consumo. A doutrina e a jurisprudência já consagram que a pessoa idosa, além de hipossuficiente, pode ser considerada hipervulnerável, exigindo tratamento ainda mais protetivo nas relações contratuais.


Por sua vez, o Direito de Família, especialmente após a promulgação do Estatuto do Idoso, passou a tratar a velhice não como uma fase de exclusão, mas como etapa de afirmação de direitos fundamentais. Neste contexto, a tutela jurídica da pessoa idosa envolve o cuidado e a proteção da dignidade humana, que deve nortear as relações afetivas e patrimoniais, inclusive fora do núcleo familiar.


A lógica familiar na proteção contra práticas abusivas

É nesse ponto que se evidencia a correlação entre os dois ramos: o fornecedor, ao induzir idosos a contratar seguros pagos, mascarados como benefícios gratuitos, além de violar normas consumeristas, também atentaram contra a função social da família e contra a segurança alimentar e emocional de seus membros mais idosos.


O desconto indevido sobre os proventos previdenciários afeta diretamente a subsistência do idoso e compromete sua autonomia, justamente no momento em que ele depende de estabilidade e amparo.


A jurisprudência do TJSP reconheceu que o dano moral coletivo independe de prova individualizada e que o impacto da conduta praticada atingiu não só os titulares dos contratos, mas a coletividade de idosos, afetando valores constitucionais como a dignidade, o respeito e a proteção da pessoa idosa.


Um alerta para o sistema de justiça e para as famílias

Casos como esse apontam a necessidade de atuação coordenada entre órgãos de defesa do consumidor, Ministério Público, Judiciário e famílias. A omissão ou a conivência diante de condutas que exploram a vulnerabilidade de pessoas idosas resulta em múltiplas violações: de direitos patrimoniais, da dignidade da pessoa humana e da função protetiva do Estado e da sociedade.


A decisão também serve de alerta para que familiares fiquem atentos a contratos, ligações e correspondências recebidas por seus membros em idade mais avançada, não como forma de tirar-lhes autonomia, mas como meio de proteção e atenção contra práticas que possam violar a integridade material e emocional da pessoa idosa.


Conclusão

A convergência entre o Direito de Família e o Direito do Consumidor revela que a proteção à pessoa idosa vai além dos laços afetivos e se estende à preservação de sua autonomia, segurança econômica e dignidade. O caso julgado pelo TJSP representa um avanço na compreensão do papel integrador do sistema jurídico, reafirmando que o ordenamento deve proteger, de forma ampla e concreta, os que se encontram em situação de maior vulnerabilidade.



Marco Alves




 
 
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